Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Porto Velho e a Justiça Global vêm a público manifestar sua indignação diante do resultado do julgamento que absolveu todos os agentes públicos acusados de participação na chacina de 2002 ocorrida no presídio Urso Branco, em Rondônia. O caso resultou na morte de pelo menos 27 (vinte e sete) pessoas e ganhou repercussão internacional pela brutalidade dos assassinatos, que envolveram até decapitação, choque elétrico e enforcamento.
As organizações que assinam esta nota (peticionárias do Caso do Presídio Urso Branco na OEA) entendem que o massacre de 2002 só foi possível porque as autoridades responsáveis pela segurança e administração do presídio colocaram os presos ameaçados de morte no mesmo pavilhão que outros detentos, embora conhecessem os evidentes riscos dessa medida.
Esse também foi o entendimento do próprio Ministério Público na época, quando ofereceu denúncia contra 44 internos do presídio e 6 autoridades públicas: o então Diretor Geral do presídio, o ex-Diretor de Segurança, o ex-Gerente do Sistema Penitenciário e o ex-Superintendente de Assuntos Penitenciários de Rondônia, além de dois oficiais da Polícia Militar do estado. Na denúncia, o MP chegou a afirmar expressamente: “Os presos do ‘SEGURO’ [os ameaçados] foram arrastados para os pavilhões (...) esperneando e clamando por suas vidas, com a certeza das atrocidades que iriam sofrer, e os agentes públicos foram insensíveis aos desesperados apelos.”
Porém, os julgamentos realizados nesta última semana levaram à absolvição de Rogélio Pinheiro Lucena, Edilson Pereira Da Costa e Weber Jordano Silva, que ocupavam, respectivamente, os cargos de Gerente do Sistema Penitenciário do estado, Diretor de Segurança do Presídio Urso Branco e Diretor Geral do mesmo presídio. As demais autoridades denunciadas sequer serão levadas a júri, tendo sido liberadas no curso do processo. Vale ressaltar que o próprio Ministério Público requereu a absolvição do ex-Diretor de Segurança da unidade, Edilson Pereira da Costa, sob o argumento frágil de que ele apenas teria cumprido as ordens estabelecidas pelos seus superiores.
Em resumo, nenhum agente público foi responsabilizado pelas mortes que ocorreram dentro do presídio, e, portanto, sob a custódia do Estado. Somente os internos do Urso Branco foram condenados em 2010 e 2011 a penas que variam de 400 a 500 anos de prisão, sendo muitos deles julgados à revelia ou com acesso a uma precária assistência jurídica.
O fato de apenas os presos do Urso Branco terem sido condenados pelo massacre de 2002 evidencia a seletividade da Justiça Criminal, que atua com particular ineficiência na apuração de crimes cometidos por agentes públicos. Com a absolvição de todas as autoridades públicas, o Estado de Rondônia se exime da responsabilidade pelos assassinatos ocorridos sob sua custódia, reafirmando sua postura falha no que se refere à proteção dos direitos humanos da população encarcerada.
Os resultados inaceitáveis dos julgamentos dessa semana serão comunicados à Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA e poderão reforçar a necessidade de condenação do Estado brasileiro por esse Tribunal Internacional.
Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Porto Velho
Justiça Global
Fevereiro de 2011.
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Tamara Melo
Advogada
Justiça Global
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